Houve, nos últimos anos, avanços no saneamento básico brasileiro, mas a situação continua precária, revelam os dados mais recentes do ranking elaborado pelo Instituto Trata Brasil em parceria com a GO Associados. Para acabar com os indicadores vergonhosos, é preciso acelerar os investimentos. O Brasil perdeu muito tempo deixando o setor à mercê das empresas estatais de água e esgoto, sem capacidade de investir e dominadas por interesses políticos. Apenas com o Novo Marco Legal do Saneamento, em 2020, a situação passou a melhorar. Infelizmente, em ritmo aquém do necessário para oferecer condições sanitárias dignas à população.
Agora, a questão a resolver é como acelerar os investimentos para atingir a meta de, até 2033, levar água tratada a quase toda a população e o esgoto a 90%. Pelos últimos dados, falta água potável a 16,9% dos brasileiros, e 44,8% não têm coleta de esgoto. Para universalizar os serviços, estima o documento, seria preciso dobrar o volume atual de investimentos — de R$ 22,5 bilhões verificados em 2022 para R$ 46,3 bilhões anuais até 2033.
Apenas 12 dos cem maiores municípios brasileiros investiram acima da meta. Os 20 piores registraram investimento anual médio de R$ 78,40 por habitante, 65% abaixo do patamar necessário para a universalização (R$ 223,82). Nove das 20 cidades em pior situação ficam na Amazônia. Tal realidade não deverá passar despercebida aos participantes da COP30. A própria cidade-sede, Belém, convive com esgoto a céu aberto e padrões distantes do aceitável no abastecimento de água. Das 20 piores cidades, 14 ficam no Norte ou Nordeste, incluindo as capitais Recife, Maceió, Manaus, São Luís, Macapá e Porto Velho.
A análise comparativa das informações revela disparidades que refletem a qualidade da gestão pública. Um exemplo é Niterói, terceira colocada no ranking — abaixo apenas de Campinas e Limeira, ambas em São Paulo. Ela tem como vizinho o município de São Gonçalo, também às margens da Baía de Guanabara, mas na 94ª posição. Cidades coladas uma na outra, mas com perfis de saneamento opostos. Vale lembrar que, em Niterói, os serviços de saneamento foram concedidos ao setor privado em 1999, Campinas é atendida por uma empresa de economia mista e Limeira por uma concessionária privada. Os bons resultados dessas cidades não ocorreram por acaso, mas porque nelas operam empresas com capacidade de investir.
Da região do Grande Rio também aparecem mal colocadas São João de Meriti e Belford Roxo. Até 2021, o governo fluminense controlava a Cedae. Com a privatização, a cidade do Rio passou da 77ª para a 43ª posição, mas neste ano voltou a cair, para a 59ª. Uma das explicações está no ajuste populacional trazido pelo Censo. Mas também houve queda no acesso a água e na coleta de esgoto e, mesmo com a privatização e a melhora perceptível, o investimento continua aquém do necessário.
“Os municípios precisam de planejamento de longo prazo, saber que obras precisam ser feitas, de onde virão recursos e acompanhar”, diz Luana Pretto, presidente executiva do Trata Brasil. A universalização, diz ela, depende de tornar o saneamento uma agenda prioritária nos municípios, abandonando o velho lugar-comum segundo o qual obra enterrada não dá voto.
Editorial do jornal O Globo de 21.07.2025
Fonte: https://oglobo.globo.com/