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Ataques de Trump testam maturidade do país

Ataques de Trump testam maturidade do país

Não há dúvidas de que a elevação de tarifas de importação sobre produtos brasileiros pelos EUA é má notícia. No entanto, é possível conter danos e há espaço para alguns desdobramentos benignos desse episódio.

O custo econômico das tarifas é administrável, já que as exportações para os EUA, de US$ 40 bilhões, representaram apenas 12% do total embarcado em 2024 e menos de 2% do PIB brasileiro.

Como cerca de dois terços das exportações são de commodities (petróleo, ferro e aço, café, sucos de frutas, carnes e celulose), o direcionamento para outros mercados é mais viável.

Além disso, os impactos nas cadeias produtivas e no mercado de trabalho são menores. Fosse o Brasil exportador principalmente de manufaturas, os efeitos indiretos das tarifas sobre o PIB seriam maiores, muito além das perdas para as conhecidas empresas de bens de capital.

Há ainda custos indiretos associados ao aumento das incertezas, prejudicando investimentos dos setores impactados. Isso não apenas pela baixa previsibilidade das ações de Trump, mas também pelas consequências de eventual retaliação do governo brasileiro, podendo levar ao recrudescimento do conflito comercial.

Como agravante, faltam instrumentos de negociação pelo fato de o ataque do presidente americano ter motivação política, carecendo de racionalidade econômica. Afinal, a relação comercial com os EUA é deficitária e os produtos exportados não ameaçam a indústria daquele país.

A atuação pragmática da diplomacia brasileira, por sua vez, poderá atenuar essas incertezas. Discussões sobre retaliações precisam ser apenas instrumento de dissuasão. Sem contar que barreiras ao comércio são também prejudiciais ao país que as adota, pois ferem a eficiência econômica e elevam custos.

Esse episódio traz também novos elementos ao quadro político, antecipando dinâmicas da disputa eleitoral de 2026 — provavelmente tem contribuído para a maior volatilidade do dólar.

As pesquisas de opinião e a dinâmica das redes sociais revelam o fortalecimento de Lula e a decepção com bolsonaristas. De um lado, esse quadro favorece a governabilidade do presidente e, de outro, abre espaço para conter extremos de polarização no país.

Pode-se afastar um cenário de precoce enfraquecimento do presidente, que o tornaria um “pato-manco” (lame duck) — expressão da ciência política para se referir a um governante com reduzida capacidade de exercer o poder, devido ao menor tempo restante, à baixa aprovação e à menor probabilidade de reeleição do partido.

Uma situação em que o apoio político ao presidente esvai, pois seu poder hoje depende da perspectiva de poder futuro.

A fraqueza do governante desequilibra os Poderes em favor do parlamento — particularmente do Centrão, por conta da polarização — e cria incentivos para políticas eleitoreiras do Executivo, sem fonte de recursos assegurada.

Nessa linha, o Congresso vem impondo perdas ao governo e tomando decisões polêmicas, a toque de caixa, em temas que demandariam maior debate. Foi o caso do novo marco para o licenciamento ambiental, dos jabutis do PL das eólicas offshore, cujos vetos do presidente foram derrubados, e da PEC 66, que adia pagamentos de precatórios das três esferas de governo.

Do lado do Executivo, a lista de medidas eleitoreiras cresce, como o PL do Gás para Todos e da MP que amplia a isenção da conta de luz para famílias de baixa renda. Fora as medidas para as classes médias, como a ampliação do Minha Casa Minha Vida e a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil.

Concorrência na política é essencial para o debate de propostas para o país e para a alternância de poder. Já presidente fraco e extremismos ideológicos não são boa notícia para a agenda econômica. Vale lembrar que as políticas eleitoreiras de Bolsonaro e a “terceirização” da agenda econômica para o Centrão cobraram seu preço.

As investidas de Trump testam a resiliência da economia e a maturidade política do país. O pragmatismo diplomático tende a prevalecer. Já o quadro político, é difícil cravar que ele será mais saudável daqui para frente. Mas a julgar pelas reações da sociedade, espaço para esse cenário existe.

Zeina Latif, economista

Fonte: https://oglobo.globo.com/